sexta-feira, 25 de setembro de 2015


 Cirurgia deixa menina tetraplégica em MG

Terra Notícias
05/11/2003

Menina de sete anos ficou tetraplégica após receber anestesia geral na Santa Casa de Montes Claros

Comentário SACIMatéria publicada em 4 de novembro de 2003.
MONTES CLAROS/MG - A professora Edite de Oliveira Souza impetrou ação judicial exigindo uma indenização de R$ 100 mil e uma pensão mensal vitalícia para sua filha, Stephane Caroline Souza Diniz, de apenas sete anos. A menina, que antes esbanjava alegria segundo sua mãe, agora vive sobre uma cama, pois ficou tetraplégica após receber anestesia geral na Santa Casa de Montes Claros, Norte de Minas, quando se preparava para realizar uma cirurgia ortopédica no cotovelo direito.
O caso está sendo julgado pelo juiz Bruno Terra Dias e a primeira audiência de conciliação aconteceu no último dia 30, no Fórum de Montes Claros, sem acordo. O magistrado abriu então a instrução do processo e o próximo passo será o interrogatório das testemunhas de acusação, ainda sem data marcada. O drama da menor revoltou familiares e vizinhos, pois a equipe médica do hospital que faria a cirurgia teria sido alertada antecipadamente que Stephane nunca havia se submetido a um teste de alergia anestésica.
O médico do Departamento Jurídico da Santa Casa, Georgino Jorge de Souza, preferiu não comentar o caso enquanto ele estiver sub judice. Ele se limitou a garantir a inocência do hospital no episódio e dizer que não concorda com uma indenização de R$ 100 mil. Se for condenada, segundo ele, a Santa Casa vai recorrer. O caso já rendeu até um inquérito policial, a pedido do Ministério Público, ainda não concluído pelo delegado Manoel Vicente de Oliveira. Nele, o anestesista Edvard Tadeu Mota Nobre diz que seus procedimentos foram corretos e que a tetraplegia da menina foi uma fatalidade.
O drama de Stephane começou em 8 de maio de 2002, quando ela sofreu uma queda na cidade onde mora, Janaúba, e fraturou o cotovelo direito. Segundo Edite Souza, como no dia seguinte a menina ainda sentia muitas dores, foi atendida na Santa Casa e Montes Claros pelo ortopedista Paulo Denucci, pelo pediatra Jorge Luiz Carvalho Almeida e pelo anestesista Edvard Nobre. Os três teriam optado por uma cirurgia ortopédica de fratura supracondiliana de úmero direito, marcada para o dia 10. Na oportunidade, segundo a mãe da menina, os três médicos garantiram que se tratava de um procedimento simples, sem complicações.
Apesar da simplicidade da cirurgia, Edite Souza garante que alertou os médicos de que sua filha nunca tinha feito teste de alergia para a anestesia. A professora lembra que, inicialmente, seria ministrada anestesia local, mas como Stephane chorava muito, o anestesista decidiu aplicar anestesia geral. Nesse ponto, a menina, segundo os médicos que a atenderam, teria sido vítima de uma "Síndrome de Hipertermia Maligna", reação rara às drogas que compõem a anestesia geral.
Após ficar internada no CTI da Santa Casa, a menina recebeu alta e, desde fevereiro passado, faz tratamento no Hospital Sarah Kubitschek, em Belo Horizonte. A médica Dilene Lúcia Silva Lima Campos, da Rede Sarah, emitiu laudo atestando o quadro clínico irreversível de Stephane, documento anexado à ação. Em sua reabilitação, a menina é obrigada a tomar medicamentos que custam R$ 139,67 por mês.
Por esse motivo, na ação judicial, o advogado Jackson Ferraz, que representa Stephane, pede, além do pagamento de indenização e pensão, a garantia do tratamento da menor, com o custeio de todos os medicamentos. "O que mais me revolta é que fui conversar com o anestesista, depois da minha filha ficar tetraplégica, e ele disse que não foi realizado o teste para verificar se ela tinha alergia porque era muito caro. Segundo ele, nem em país do primeiro mundo o teste é realizado", conta Edite Souza. Stephane e a mãe passam a maior parte do tempo na casa da avó materna, no Bairro Morrinhos, em Montes Claros.
O anestesista Edvar Tadeu Mota Nobre descarta a possibilidade de erro médico no relatório anexado ao processo. Segundo ele, Stephane foi vítima da "Síndrome de Hipertermia Maligna", uma reação adversa a algumas drogas usadas na anestesia geral, como Atropina, Thionenbutal, Quelicin, Halotano e o antibiótico Keflin.
De acordo com Edvar Nobre, tão logo foi constatada a rigidez do corpo da menor, ela foi internada no CTI da Santa Casa, em coma, recebendo toda a atenção da equipe médica da instituição. Pelo relatório, a "Síndrome de Hipertermia Maligna" também foi constatada pelo neurologista Adriano Teixeira e pelos anestesistas Torquarto Gonçalves Fonseca e Marília Guimarães Heyden Barbosa. O neurologista Adriano Teixeira ressalta que o ocorrido com a menina é raro na Medicina.
Em seu depoimento à polícia, Edvar Nobre garante ter seguido todos os procedimentos técnicos antes da cirurgia e lembra que, em 20 anos de carreira, essa foi a primeira vez que um problema assim aconteceu. Segundo as declarações do médico, quando a cirurgia estava prestes a começar, a criança estava amedrontada e inquieta, dificultando a administração da anestesia local. A alternativa então, segundo ele, foi a anestesia geral.
Através de seu advogado, Carlos Américo Cardoso Moreira, o anestesista disse ontem que a anestesia local é pouco recomendável para crianças. Diante disso, está configurado que não ocorreu erro médico. Por esse motivo, o advogado já pediu a extinção do processo de indenização.
O caso começou a ser investigado pela polícia por determinação da promotora da Curadoria da Infância e Adolescência, Valmira Alves Maia, após receber denúncia da mãe da vítima. Nos depoimentos à polícia, os outros médicos que participaram da cirurgia, Paulo Denucci e Jorge Luiz Carvalho Almeida, também descartam qualquer irregularidade, versão corroborada pelo neurologista Adriano Teixeira. Mas em nenhum momento no inquérito e no processo foi perguntado aos envolvidos sobre a obrigação de fazer o teste de alergia anestésica no paciente antes da cirurgia.

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