domingo, 28 de junho de 2020

Médicos e enfermeiros são alvos de ao menos 79 denúncias

Denúncias feitas aos conselhos regionais devem ser apuradas, podem virar processos éticos e gerar penalidades aos profissionais. Pelo menos seis processos éticos sobre o assunto já estão em andamento. Compartilhamento de informações falsas é um dos perig.

BRASILDomingo, 28 de junho de 2020, 08:58 - A | A
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Um levantamento feito pelo G1 revela que ao menos 79 denúncias foram registradas contra médicos e enfermeiros por divulgação de fake news ou 'curas milagrosas' durante a pandemia do novo coronavírus. Em 40 casos, foram abertas sindicâncias para apurar a denúncia; em seis, já há processos éticos.
Para o levantamento, o G1 entrou em contato com as assessorias de todos os 27 conselhos regionais de medicina e dos 27 conselhos de enfermagem e também mandou um pedido para cada um deles por meio da Lei de Acesso à Informação. Isso porque os conselhos federais informam que não têm números consolidados.
Das 79 denúncias, 59 foram registradas pelos conselhos regionais de medicina e 20 pelos de enfermagem. Os conselhos regionais de medicina também registram a maior parte das sindicâncias (36 de 40) e dos processos éticos (5 de 6). Em 20 de março, o Conselho Federal de Enfermagem suspendeu por dois meses os prazos para os procedimentos por causa do isolamento social.

A maioria dos conselhos regionais, porém, não dá detalhes sobre denúncias, sindicâncias ou processos éticos

Parte das denúncias recebidas pelos conselhos regionais gerou interdição temporária das atividades profissionais, como no caso do médico Joaquim Rocha Pereira. Em vídeo publicado nas redes sociais, ele afirmou que a mutamba, uma planta encontrada no Cerrado, pode prevenir a Covid-19 – o que é mentira – e também divulgou mensagens minimizando a pandemia e criticando as medidas de prevenção.
O CRM do Tocantins decidiu interditar a atuação profissional dele e proibiu o exercício na área por seis meses. Na época, o médico reafirmou o conteúdo dos vídeos e disse que pretendia entrar com uma ação para derrubar a decisão do conselho.
Já a médica Isabella Resende Abdalla, de Ribeirão Preto (SP), foi afastada temporariamente do exercício da profissão porque anunciava e vendia um "soro da imunidade" como solução para a doença. Não é verdade que a soroterapia combate o coronavírus.
O advogado de Isabella disse que ingressou "com recursos administrativos e judiciais contra o afastamento imposto" e que a "decisão foi alterada, quase que por unanimidade, pelo Conselho Federal de Medicina no fim de maio, permitindo que a médica voltasse aos seus atendimentos".
No Distrito Federal, o médico Pedro Henrique Leão oferecia um kit com "imunidade de leão" contra a Covid-19 e também foi proibido de atuar na profissão por decisão do conselho regional. Os medicamentos chegavam a custar R$ 1,3 mil.
Na internet, Leão negou que tenha feito promessas em relação à cura do novo coronavírus. A defesa do médico disse ainda que a suspensão foi "precipitada e desproporcional" e que vai tentar reverter a decisão.
Já o enfermeiro Anthony Ferrari, que mora em Cabo Frio e é investigado pelo Conselho Regional do Rio de Janeiro, publicou vídeos nas redes sociais afirmando que estados e municípios recebem dinheiro do governo federal por paciente morto com a Covid-19.
Ainda segundo ele, os valores chegam até R$ 19 mil. Ferrari disse ainda que cerca de 60% das mortes da Covid-19 são de pessoas que "morreram por estar assustadas", "morreram porque muitos falaram para ficar em casa".
O Fato ou Fake já checou essa informação falsa e mostrou que isso não é verdade.
Em nota, o enfermeiro disse que não tem condenação no conselho regional nem no conselho federal. "O que acontece é que esquerdopatas ficam fazendo denúncias por eu estar denunciando a corrupção, estar denunciando o terrorismo que eles estão colocando para poder usar o vírus para se promover."
 A maioria dos conselhos regionais, porém, não dá detalhes sobre denúncias, sindicâncias ou processos éticos.
'Fake news' de jaleco
Apesar dos números revelados pelo levantamento, o G1 identificou pelo menos dois médicos que estão em situação "regular", segundo o site do Conselho Federal de Medicina, e gravam vídeos com informações falsas, sem qualquer embasamento científico e alcançam milhares de visualizações.
Normalmente, quando é aplicada alguma medida pelo conselho, esse status no site muda de "regular" para "interdição cautelar", "suspensão temporária" ou até "cassado".
Um dos médicos é Marcos Nunes Andrade, que se autodenomina Dr. Marcos da Amazônia, morador de Santarém, no Pará. Em um canal no YouTube, ele disse em 5 de abril deste ano que os hospitais estavam vazios. "Tá tudo vazio [referindo-se aos hospitais]. Cadê os doentes que estão mandando ver na mídia da morte? Tá tudo vazio."
No mesmo vídeo, que registra mais de 600 mil visualizações na publicação original, ele afirmou ainda: "A cloroquina cura. A cloroquina cura. Porque ela é associada ao sulfato de zinco, aquele que vai destruir o coronavírus. Agora, a cloroquina serve como veículo para o sulfato de zinco." Vários estados relataram a superlotação dos leitos de UTI e não há comprovação científica quanto à eficácia e à segurança no uso de cloroquina em pacientes com a Covid-19.
O médico Marcos Andrade foi procurado pelo G1 e não respondeu aos questionamentos.
O Conselho Regional de Medicina do Pará não informa se alguma denúncia contra o médico foi registrada ou se alguma penalidade já foi aplicada em razão dos vídeos. A inscrição do profissional no site do Conselho Federal de Medicina consta como "regular" – e não "interdição cautelar" ou "suspensão temporária", por exemplo.
"Os dados relativos a possíveis procedimentos administrativos não podem ser fornecidos pelos conselhos regionais de medicina em razão da necessidade de evitar pré-julgamento ou quebra de sigilo, qualquer que seja a situação questionada", diz a nota do conselho regional.
Já o médico João Carlos Luiz Vaz Marques Leziria, ou Dr. João Vaz, teve pelo menos dois vídeos com fake news compartilhados na internet. No primeiro, ele passou o próprio celular e se ofereceu para fazer receitas médicas, inclusive para a compra da hidroxicloroquina – um medicamento não comprovadamente eficaz e seguro para a Covid-19.
Além disso, ele também disse que os respiradores estão sendo usados em hospitais públicos apenas para justificar as compras. "Falem comigo, eu dou a receita para vocês comprarem em qualquer farmácia. Nós temos azitromicina, um antibiótico para as vias respiratórias superiores, em conjunto com a hidroxicloroquina."
Outro vídeo com conteúdos falsos ditos por João Vaz já foi checado pelo Fato ou Fake. O médico disse para as pessoas não usarem máscara caso não estejam falando com alguém ou estejam andando na rua. Ele afirmou ainda que o uso de máscara de proteção faz mal à saúde tornando o sangue mais ácido.
As afirmações do médico são contestadas por especialistas e também pelo Ministério da Saúde. Além disso, o uso da máscara é recomendado pelas autoridades de saúde para evitar disseminação da doença e não traz perigo para as pessoas.
Apesar dos vídeos, o site do Conselho Federal de Medicina mostra que a inscrição de João Vaz está "regular" – e não "interdição cautelar" ou "suspensão temporária", por exemplo.
O médico João Vaz foi procurado e reafirmou tudo o que disse no vídeo.
O Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro não informa se alguma denúncia contra o médico foi recebida ou mesmo se qualquer penalidade foi aplicada. Na nota, o conselho diz que "existe um rito para se respeitar, inclusive, com o direito à ampla defesa" e que "se houver uma denúncia, ela vai ser enviada ao médico para que ele possa se explicar".
"Neste caso, um sindicante conselheiro vai avaliar se há algum indício, juntar as provas como um processo similar a um rito jurídico. Não é possível ter uma resposta rápida. E, agora, estamos nesse momento de restrição. O setor de processos ainda está se adequando para a reabertura. Então, se houver alguma denúncia, ela será apurada e, após todas as verificações necessárias, será dada a finalização do processo."
Maior credibilidade
Além disso, também circulam nas redes sociais áudios, vídeos e mensagens que apenas usam os nomes de profissionais de saúde. Os profissionais, porém, são vítimas, já que não produziram o conteúdo e só tomaram conhecimento após a viralização do material. O Conselho Regional de Medicina de Goiás, por exemplo, informou que foi procurado no fim de março por uma médica que "teve o nome indevidamente vinculado a um áudio falso veiculado em grupos de WhatsApp com informações incorretas sobre a pandemia".
O Fato ou Fake já checou também mensagens falsas que envolvem profissionais da saúde. Entre elas estão um video com a alegação de que uma equipe médica forjou um caso da Covid-19 em São Paulo e uma foto que dizia que um profissional estava segurando um caixão com apenas dois dedos e enterrando caixões sem corpos em Manaus.
Em outra desinformação, um vídeo feito por uma enfermeira foi tirado de contexto e passou a ser compartilhado como se fosse novo, mostrando uma UTI vazia em Salvador, na Bahia. No entanto, a gravação era de 21 de março, e não de 21 de abril, quando se tornou viral. A mensagem dizia ainda que a enfermeira foi demitida após ter "denunciado" a farsa do novo coronavírus, o que também não era verdade, como mostrou a checagem do Fato ou Fake.
O cenário da pandemia da Covid-19 também foi aproveitado por falsos médicos, que tentaram lucrar com fórmulas milagrosas para combater a doença.
Durante a pandemia, também precisaram ser checadas ou até foram alvos de investigações dos órgãos públicos outras várias falsas curas milagrosas da Covid-19, como as do feijão milagroso, do chá de artemísia, da aplicação do ozônio e da mistura de limão com bicarbonato, entre outros.
A Organização Mundial de Saúde fez um alerta em fevereiro deste ano do risco da infodemia, com o alto volume de informações que dificulta o acesso a fontes e orientações confiáveis.
Em 14 de maio, profissionais e organizações de saúde de vários países lançaram uma campanha internacional pedindo ações para combater informações falsas divulgadas na internet sobre a pandemia do novo coronavírus.
Punição a profissionais
O presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Mauro Ribeiro, e o diretor do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) Gilney Guerra lembram que médicos e enfermeiros precisam seguir o código de ética das categorias. Caso os profissionais não cumpram as regras, eles podem sofrer penalidades.
Segundo Guerra, a medida adotada pelo conselho depende da gravidade da denúncia, da veracidade dos fatos, do dano que causou ao terceiro, dos antecedentes profissionais, entre outros. São possíveis penalidades:
Advertência verbal
Multa em dinheiro
Censura (manifestação do conselho censurando o ato no Diário Oficial e num jornal de circulação)
Suspensão temporária do exercício profissional
Cassação do exercício profissional

Guerra lembra ainda que a resolução 544 de 2017 do Cofen respeita a liberdade de expressão dos enfermeiros, mas define critérios para uso e comportamento dos profissionais nas redes sociais. Entre os itens proibidos pelo conselho estão a divulgação de fotos de pacientes sem o consentimento deles nas redes sociais; a propaganda de método ou técnica sem comprovação científica e que esteja vedado pela legislação de enfermagem vigente; e a adulteração de dados estatísticos.
"O profissional de saúde tem que se basear nas evidências científicas. Quando ele divulga algo baseado em um estudo que foi publicado por uma revista e que traz uma fonte de informação, ele não pode ser censurado. Mas quando o profissional de saúde traz à tona determinadas recomendações que não têm evidência científica, não são recomendadas por autoridades sanitárias do país, como secretarias estaduais, Ministério da Saúde, ou mesmo OMS, ele está fazendo na verdade um desserviço. Ele está trazendo desinformação", diz o diretor do Cofen e professor de enfermagem do Centro Universitário do Planalto Central (Uniceplac).
O presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Mauro Ribeiro, reforça que os médicos também devem checar se as fontes são confiáveis antes de compartilhar ou produzir conteúdo para divulgar nas redes sociais.
"Como profissionais, recomenda-se aos médicos que usem as redes sociais dentro dos limites estabelecidos pelo Código de Ética Médica, ou seja, com o uso de informações validadas cientificamente e no intuito de promover a adoção de comportamentos e hábitos saudáveis. Não é recomendável aos médicos e a qualquer outra pessoa distribuir informações sem que as fontes sejam confiáveis", diz Mauro Ribeiro, presidente do CFM.
Ribeiro acrescenta ainda que qualquer pessoa que identifique situações em que o médico descumpra o código de ética "pode apresentar sua queixa no Conselho Regional de Medicina do estado onde ocorreu a situação que considerou irregular". "É importante, mas não obrigatório, juntar documentos, imagens e outros documentos. Com base nisso, o CRM que vai apurar o assunto e tomar as medidas cabíveis."
Guerra lembra que a denúncia pode ser feita tanto pelo site quanto presencialmente nos conselhos regionais. "Todos os conselhos regionais têm que averiguar as denúncias. Qualquer cidadão pode preencher o formulário no site e também ir diretamente à sede dos conselhos. A denúncia anônima é vedada", afirma.

Vídeo com enfermeiros 'forjando' casos de covid-19 em SP é falso

Imagem serviria para mostrar casos inflados de covid-19 em SP

Imagem serviria para mostrar casos inflados de covid-19 em SP

Reprodução Facebook

Imagens foram feitas no México com uma equipe médica que atendeu um paciente que teve covid-19 e estava sendo levado para isolamento


Uma notícia falsa circulou pelas redes sociais em que um vídeo com imagens de enfermeiros e médicos preparando uma maca com tela de isolamento em uma rua serviriam para alertar para supostos casos de inflação de números de covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, em São Paulo. O vídeo completo se referente a um caso do México e mostra uma pessoa acometida pela covid-19, levada ao isolamento por uma ambulância.
Um homem com roupas pretas aguarda em pé a preparação da maca ao lado do veículo. Quando tudo está pronto, ele se deita e é colocado na parte de dentro da ambulância. Mensagens que acompanharam o vídeo na internet diziam se tratar de um caso forjado de covid-19 em São Paulo para aumentar os números de mortes registrados no estado. 
A versão do vídeo que circula nas redes sociais tem a imagem ampliada, mostrando apenas a ambulância. Na internet, porém, há uma versão completa do vídeo. Ele foi publicado por veículos jornalísticos mexicanos em maio e mostra a cena completa.
Segundo as publicações, o homem é um trabalhador de Tuxpan, no estado de Veracruz, no México, que estava com suspeita de covid-19. As imagens registram o momento em que a equipe de saúde municipal realiza seu transporte para um hospital municipal.
A confirmação de que, no Brasil, se tratava de uma notícia falsa veio também por meio de uma publicação de uma das autoridades do país. 
O presidente municipal, espécie de prefeito, Juan Antonio Aguilar Mancha, fez uma publicação em suas nas redes sociais parabenizando os envolvidos na ação de levar o homem para o isolamento. "Após várias horas de espera, a equipe municipal de saúde teve que colocar tudo em primeiro lugar para salvaguardar a vida de um ser humano. Talvez alguns critiquem, mas é melhor fazê-lo do que não."
Na mensagens falsas, a informação que acompanhava o vídeo era de que "o estado mais rico do Brasil", referindo-se a São Paulo, tem "um dos maiores números de mortes por milhão de habitantes do país" e que isso é causado pela inflação das notificações.



Fake news na saúde: entenda como surgem e se espalham as notícias falsas

fake news na saúde
  • junho/2019
As fake news na saúde são um dos temas mais recorrentes entre os conteúdos falsos que circulam na internet e nas redes sociais. Procedimentos milagrosos, remédios que garantem cura instantânea e toda sorte de promessas seduzem quem procura ajuda médica. Nesse contexto, os profissionais de saúde são indispensáveis na mediação entre o que a imprensa publica e o que a ciência atesta.
E não é difícil entender de onde nascem muitas distorções. A maneira como as informações saem do mundo acadêmico nem sempre é clara ou acessível ao público não especializado. Isso dá margem a interpretações rasas e duvidosas.
“Erros podem ter sua raiz na etapa de construção do press release”, explica Raquel Aguiar, responsável pela área de comunicação da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e coordenadora-adjunta do Observatório Saúde na Mídia. O press release, termo técnico do jornalismo, é o texto enviado aos veículos de comunicação por assessorias de imprensa. O material geralmente sugere um tema para ser notícia nos veículos.
Outro ponto importante é que a propagação desenfreada das fake news na saúde é motivada pelo medo. As pessoas temem doenças e isso mexe com a sensibilidade delas. Ou já sofrem com determinada patologia, procurando incessantemente por uma cura – um agravante à situação –, e têm esperança nos tratamentos prometidos.
Esses aspectos são somados ao tom alarmante, apelativo e de denúncia empregado nas matérias. O resultado é o que vemos hoje: provoca um alarde geral, sem que haja a preocupação em conferir fontes e o embasamento científico.
Todas as etapas pelas quais a informação passa são passíveis de equívocos. Compreender o modus operandi de cada área é o mais indicado. “Quando o benefício das pessoas é colocado como foco comum da imprensa e da saúde, é possível chegar a uma sintonia”, afirma Inesita Araújo, pesquisadora da Fiocruz e coordenadora do Observatório Saúde na Mídia.

Como acabar com as  fake news na saúde e as mentiras disseminadas

O Ministério da Saúde (MS) criou um canal para combater as fake news na saúde, tornando os resultados dessas análises acessíveis ao público – e também é uma forma de lutar contra à desinformação.
Desde agosto de 2018, a população pode enviar mensagens ao número disponibilizado pelo órgão com conteúdos que tenham recebido nas redes sociais. Posteriormente, esse material será investigado pelas equipes técnicas responsáveis por verificar se a informação procede ou não.
Entre as áreas da saúde, a medicina é um dos setores que mais sofre com as notícias falsas, principalmente no que se refere à vacinação. As campanhas de imunização têm sido alvo das mais diversas mentiras, e uma das principais consequências disso é a queda no número de vacinados e índices abaixo do esperado.
Tendo isso em mente, se faz necessário que médicos saibam como se posicionar contra as fake news na saúde e orientar seus pacientes a respeito do assunto. E nós preparamos um material gratuito para auxiliar esses profissionais! Aproveite para fazer download:
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Fake news na área médica preocupa profissionais

01/09/2018

Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein reúne jornalistas e pesquisadores para discutir o tema.
Quem nunca recebeu uma mensagem via rede social sobre "curas milagrosas" contra o câncer? E textos a respeito de doenças supostamente causadas pelas vacinas, ou sobre novas epidemias que estariam se espalhando pelo país? Com as redes sociais e os aplicativos de comunicação instantânea, as notícias falsas – ou fake news – se espalham cada vez mais rapidamente. Na área médica, o fenômeno tem deixado as autoridades em alerta, além de trazer consequências para o relacionamento dos profissionais de saúde com seus pacientes.
Casos em que a proliferação de informações falsas afeta o comportamento de parte da população vêm crescendo dia a dia. Em abril, por exemplo, o Ministério da Saúde teve que divulgar uma nota oficial desmentindo a existência de uma cepa H2N3 de vírus da gripe no país. "Essa é uma informação inverídica que está circulando nas mídias sociais. Os vírus de gripe que atualmente circulam no Brasil são o influenza A/H1N1pdm09, A/H3N2 e influenza B. A vacina contra gripe, cuja campanha se inicia na segunda quinzena de abril, protege contra esses tipos de três vírus", informava o documento.
​Na Itália, no começo do ano, o grupo Women for Oncology organizou um evento na Câmara dos Deputados em Roma para chamar a atenção sobre a quantidade crescente de boatos relacionados ao câncer nas redes sociais. Entre outras inverdades, essas divulgações diziam que ímãs da geladeira seriam cancerígenos, que quimioterapia é ineficaz e que as biópsias espalhavam tumores pelo corpo. "A desinformação e o hábito dos pacientes de confiar mais na internet do que nos oncologistas de verdade estão cada vez mais difundidos e abordá-los exige uma aliança entre oncologia, política e mídia", advertiram as especialistas.
A preocupação sobre a proliferação de notícias falsas sobre saúde fez o Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa (IIEP) Albert Einstein incluir na programação do seu I Fórum de Pós-Graduação Einstein: Pesquisa para a Vida o debate Divulgação Científica na Era das Redes Sociais e Fake News. Participaram da discussão os jornalistas especializados em ciência e saúde Diogo Massaine Sponchiatto (revista Saúde – Editora Abril), Carlos Orsi (Planetários de São Paulo) e Marcos Pivetta (revista Pesquisa Fapesp).
Para a intermediadora do debate, Dra. Anna Carla Goldberg, consultora de Projetos de Pesquisa do IIEP, a disseminação de tantas notícias falsas acaba contribuindo para um descrédito geral da população sobre a ciência. "O trabalho do cientista, que é respaldado por pesquisas, referências bibliográficas e metodologias consistentes acaba sendo prejudicado pelas fake news", disse.
Dra. Anna Carla explica que a disseminação de notícias falsas pode trazer danos reais à saúde da população, pois muitas pessoas mudam de comportamento em consequência do que ficam sabendo pelas redes sociais. A não vacinação é um exemplo disso. "Doenças que estavam extintas ou quase extintas, como o sarampo no Brasil e a poliomielite em outras partes do mundo, podem ressurgir em grandes proporções por conta da falta de vacinação provocada pelas fake news", acrescenta.
Preocupadas com a baixa adesão e a grande quantidade de informações erradas circulando nas mídias sociais sobre a vacina de febre amarela, as Sociedades Brasileiras de Medicina Tropical (SBMT), Infectologia (SBI), Imunizações (SBIm), Reumatologia (SBR) e Pediatria (SBP) divulgaram no último mês de março uma carta aberta aos médicos e profissionais de saúde sobre a importância dessa vacina e suas contraindicações. Na carta, elas endossam as recomendações do Ministério da Saúde e convocam médicos e profissionais da saúde a orientar seus pacientes a se vacinarem, desde que não haja contraindicações.
Outra consequência negativa das fake news sobre saúde observada pela Dra. Anna Carla pode ser a adesão a tratamentos falsos ou ineficientes. "Pessoas de várias partes do mundo chegam a viajar a países como a China em busca de tratamentos celulares sem comprovação científica", lamenta.
Com o título "Epidemia de mentiras", a revista Veja trouxe como reportagem principal da sua edição de 6 de julho as fake news na área da saúde. O texto conta histórias de diferentes pessoas que acreditaram em notícias falsas veiculadas na internet e tiveram seu estado de saúde agravado, como o comerciante Augusto Simeoni, de 59 anos de idade. Ele trocou o tratamento do diabetes recomendado pelo médico pela ingestão de um copo de baba de quiabo com água todas as manhãs. A fórmula mágica, que eliminaria a doença, naturalmente não funcionou e Simeone teve como uma das consequências um dedo do pé esquerdo amputado, depois que uma pequena ferida não cicatrizou devido à glicemia fora de controle.
Para a publicação dessa reportagem, a revista Veja fez um levantamento de 3 mil notícias sobre saúde, publicadas em seis páginas no Facebook, e selecionou cerca de mil notícias que tiveram maior número de compartilhamentos. Entre elas, descobriu-se com a ajuda de médicos, que aproximadamente um terço divulgava falsidades inquestionáveis. Os temas mais frequentes na lista de fake news foram dieta para emagrecer, câncer e diabetes.
Pessoas e não robôs espalham as fake news, indica estudo do MIT
No maior estudo já realizado sobre as notícias falsas, o The science of fake news, pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês) constataram que as informações falsas têm 70% mais chances de viralizarem que as verdadeiras. Publicado na revista Science em março de 2018, esse estudo demonstrou que cada postagem verdadeira atingia, em média, mil pessoas, enquanto que as postagens falsas mais populares - aquelas que estavam entre o 1% mais replicado – podiam atingir até 100 mil pessoas.
Os pesquisadores do MIT observaram que os robôs aceleram a disseminação de informações falsas e verdadeiras nas mesmas proporções. Ou seja, diferentemente do que se pensava anteriormente, as fake news se espalham mais que as notícias verdadeiras porque os humanos – e não os robôs – têm mais probabilidade de disseminá-las.
O estudo The science of fake news envolveu a análise de 126 mil postagens no Twitter disseminadas por mais de 3 milhões de pessoas desde 2006, quando essa rede social foi lançada, até 2017. Entre o total de notícias falsas analisadas, as mais frequentes foram sobre política, somando aproximadamente 43 mil publicações, mas as informações sobre ciência e tecnologia também ganharam destaque com cerca de 12 mil postagens.
Outra constatação importante do estudo refere-se ao perfil das pessoas que transmitem notícias falsas e verdadeiras. Segundo os pesquisadores do MIT, os usuários que espalham notícias falsas no Twitter tendem a ter menos seguidores, seguem menos gente, são menos ativos e estão no Twitter há menos tempo, em comparação aos usuários que replicam notícias verdadeiras.
​Na opinião da Dra. Anna Carla, os principais responsáveis pelas fake news sobre saúde e ciência são as pessoas não especialistas que decidem passar adiante informações que desconhecem. "Elas fazem uma avaliação superficial do assunto, encaram isso como verdade e divulgam nas suas redes sociais", diz.
​Por tudo isso, nas clínicas, nos hospitais e consultórios médicos são cada vez mais comuns os relatos de pacientes que se dirigem aos profissionais de saúde para questionar sobre temas relacionados a fake news, ou trazem questionamento sobre temas que pesquisaram nos mecanismos de busca, nem sempre sabendo identificar se as páginas encontradas traziam informações corretas. ​
Veja a seguir 5 regras básicas para identificar fake news
1. Atenção à fonte da informação
Confirme se a notícia foi divulgada por algum veículo de comunicação de credibilidade. Mesmo que no final do texto haja o nome do veículo, procure saber se de fato essa informação está disponível originalmente nesse canal de informação.
2. Desconfie do que parece sensacional
A maioria das fake news é sensacionalista. Elas costumam trazer esperança ou medo para determinadas situações. Portanto, se receber alguma informação improvável, desconfie e procure conferir se há estudos de centros de pesquisa renomados.
3. Há embasamento científico?
Mesmo que a informação recebida seja crível, procure saber se foi baseada em algum estudo que tenha seguido critérios metodológicos.
4. Amigos e familiares também repassam notícias falsas
Segundo o estudo The science of fake news, os humanos, e não os robôs, são os que mais disseminam as notícias falsas. Fique atento a qualquer informação sobre saúde divulgada nas redes sociais, independentemente de quem a tenha repassado. Diante de dúvidas, consulte um especialista.
​5. Leia o texto ou assista ao vídeo inteiro
Em vários casos, a notícia falsa não tem consistência. Basta ler ou assistir ao material com atenção para perceber que faltam explicações técnicas e científicas. Checar os nomes das instituições e das pessoas usadas como fonte, assim como a data da publicação, também ajuda a confirmar a veracidade da informação sobre ciência e saúde.

Médicos e enfermeiros são alvos de ao menos 79 denúncias por fake news e 'curas milagrosas' da Covid-19

Denúncias feitas aos conselhos regionais devem ser apuradas, podem virar processos éticos e gerar penalidades aos profissionais. Pelo menos seis processos éticos sobre o assunto já estão em andamento. Compartilhamento de informações falsas é um dos perigos durante a pandemia da Covid-19.


Por Gabriela Caesar, G1
 

Um levantamento feito pelo G1 revela que ao menos 79 denúncias foram registradas contra médicos e enfermeiros por divulgação de fake news ou 'curas milagrosas' durante a pandemia do novo coronavírus. Em 40 casos, foram abertas sindicâncias para apurar a denúncia; em seis, já há processos éticos.


Para o levantamento, o G1 entrou em contato com as assessorias de todos os 27 conselhos regionais de medicina e dos 27 conselhos de enfermagem e também mandou um pedido para cada um deles por meio da Lei de Acesso à Informação. Isso porque os conselhos federais informam que não têm números consolidados.


Das 79 denúncias, 59 foram registradas pelos conselhos regionais de medicina e 20 pelos de enfermagem. Os conselhos regionais de medicina também registram a maior parte das sindicâncias (36 de 40) e dos processos éticos (5 de 6). Em 20 de março, o Conselho Federal de Enfermagem suspendeu por dois meses os prazos para os procedimentos por causa do isolamento social.

'Fake news' e curas milagrosas da Covid-19: médicos e enfermeiros são alvos de denúncias e até processos éticos nos conselhos regionais — Foto: Rodrigo Sanches / G1

'Fake news' e curas milagrosas da Covid-19: médicos e enfermeiros são alvos de denúncias e até processos éticos nos conselhos regionais — Foto: Rodrigo Sanches / G1

Parte das denúncias recebidas pelos conselhos regionais gerou interdição temporária das atividades profissionais, como no caso do médico Joaquim Rocha Pereira. Em vídeo publicado nas redes sociais, ele afirmou que a mutamba, uma planta encontrada no Cerrado, pode prevenir a Covid-19 – o que é mentira – também divulgou mensagens minimizando a pandemia e criticando as medidas de prevenção.


O CRM do Tocantins decidiu interditar a atuação profissional dele e proibiu o exercício na área por seis meses. Na época, o médico reafirmou o conteúdo dos vídeos e disse que pretendia entrar com uma ação para derrubar a decisão do conselho.


Já a médica Isabella Resende Abdalla, de Ribeirão Preto (SP), foi afastada temporariamente do exercício da profissão porque anunciava e vendia um "soro da imunidade" como solução para a doença. Não é verdade que a soroterapia combate o coronavírus.


O advogado de Isabella disse que ingressou "com recursos administrativos e judiciais contra o afastamento imposto" e que a "decisão foi alterada, quase que por unanimidade, pelo Conselho Federal de Medicina no fim de maio, permitindo que a médica voltasse aos seus atendimentos".


No Distrito Federal, o médico Pedro Henrique Leão oferecia um kit com "imunidade de leão" contra a Covid-19 e também foi proibido de atuar na profissão por decisão do conselho regional. Os medicamentos chegavam a custar R$ 1,3 mil.

Na internet, Leão negou que tenha feito promessas em relação à cura do novo coronavírus. A defesa do médico disse ainda que a suspensão foi "precipitada e desproporcional" e que vai tentar reverter a decisão.

Já o enfermeiro Anthony Ferrari, que mora em Cabo Frio e é investigado pelo Conselho Regional do Rio de Janeiro, publicou vídeos nas redes sociais afirmando que estados e municípios recebem dinheiro do governo federal por paciente morto com a Covid-19.


Ainda segundo ele, os valores chegam até R$ 19 mil. Ferrari disse ainda que cerca de 60% das mortes da Covid-19 são de pessoas que "morreram por estar assustadas", "morreram porque muitos falaram para ficar em casa".



Em nota, o enfermeiro disse que não tem condenação no conselho regional nem no conselho federal. "O que acontece é que esquerdopatas ficam fazendo denúncias por eu estar denunciando a corrupção, estar denunciando o terrorismo que eles estão colocando para poder usar o vírus para se promover."

A maioria dos conselhos regionais, porém, não dá detalhes sobre denúncias, sindicâncias ou processos éticos.

Veja como funciona o trâmite após o envio da denúncia:


Trâmite simplificado de uma denúncia: etapas após o recebimento de uma denúncia contra profissional de enfermagem; denúncia pode resultar em penalidades após decisão do conselho regional — Foto: Rodrigo Sanches / G1


Trâmite simplificado de uma denúncia: etapas após o recebimento de uma denúncia contra profissional de enfermagem; denúncia pode resultar em penalidades após decisão do conselho regional — Foto: Rodrigo Sanches / G1

'Fake news' de jaleco




Apesar dos números revelados pelo levantamento, o G1 identificou pelo menos dois médicos que estão em situação "regular", segundo o site do Conselho Federal de Medicina, e gravam vídeos com informações falsas, sem qualquer embasamento científico e alcançam milhares de visualizações.

Normalmente, quando é aplicada alguma medida pelo conselho, esse status no site muda de "regular" para "interdição cautelar", "suspensão temporária" ou até "cassado".

Um dos médicos é Marcos Nunes Andrade, que se autodenomina Dr. Marcos da Amazônia, morador de Santarém, no Pará. Em um canal no YouTube, ele disse em 5 de abril deste ano que os hospitais estavam vazios. "Tá tudo vazio [referindo-se aos hospitais]. Cadê os doentes que estão mandando ver na mídia da morte? Tá tudo vazio."

No mesmo vídeo, que registra mais de 600 mil visualizações na publicação original, ele afirmou ainda: "A cloroquina cura. A cloroquina cura. Porque ela é associada ao sulfato de zinco, aquele que vai destruir o coronavírus. Agora, a cloroquina serve como veículo para o sulfato de zinco." Vários estados relataram a superlotação dos leitos de UTI e não há comprovação científica quanto à eficácia e à segurança no uso de cloroquina em pacientes com a Covid-19.

O médico Marcos Andrade foi procurado pelo G1 e não respondeu aos questionamentos.

O Conselho Regional de Medicina do Pará não informa se alguma denúncia contra o médico foi registrada ou se alguma penalidade já foi aplicada em razão dos vídeos. A inscrição do profissional no site do Conselho Federal de Medicina consta como "regular" – e não "interdição cautelar" ou "suspensão temporária", por exemplo.


"Os dados relativos a possíveis procedimentos administrativos não podem ser fornecidos pelos conselhos regionais de medicina em razão da necessidade de evitar pré-julgamento ou quebra de sigilo, qualquer que seja a situação questionada", diz a nota do conselho regional.

Mensagens, áudios e vídeos falsos são compartilhados durante a pandemia da Covid-19; representantes dos conselhos federais de medicina e enfermagem alertam para profissionais checarem as fontes antes de produzir ou compartilhar conteúdo online — Foto: Rodrigo Sanches/G1
Mensagens, áudios e vídeos falsos são compartilhados durante a pandemia da Covid-19; representantes dos conselhos federais de medicina e enfermagem alertam para profissionais checarem as fontes antes de produzir ou compartilhar conteúdo online — Foto: Rodrigo Sanches/G1

Já o médico João Carlos Luiz Vaz Marques Leziria, ou Dr. João Vaz, teve pelo menos dois vídeos com fake news compartilhados na internet. No primeiro, ele passou o próprio celular e se ofereceu para fazer receitas médicas, inclusive para a compra da hidroxicloroquina – um medicamento não comprovadamente eficaz e seguro para a Covid-19.

Além disso, ele também disse que os respiradores estão sendo usados em hospitais públicos apenas para justificar as compras. "Falem comigo, eu dou a receita para vocês comprarem em qualquer farmácia. Nós temos azitromicina, um antibiótico para as vias respiratórias superiores, em conjunto com a hidroxicloroquina."

Outro vídeo com conteúdos falsos ditos por João Vaz já foi checado pelo Fato ou Fake. O médico disse para as pessoas não usarem máscara caso não estejam falando com alguém ou estejam andando na rua. Ele afirmou ainda que o uso de máscara de proteção faz mal à saúde tornando o sangue mais ácido.



As afirmações do médico são contestadas por especialistas e também pelo Ministério da Saúde. Além disso, o uso da máscara é recomendado pelas autoridades de saúde para evitar disseminação da doença e não traz perigo para as pessoas.


Apesar dos vídeos, o site do Conselho Federal de Medicina mostra que a inscrição de João Vaz está "regular" – e não "interdição cautelar" ou "suspensão temporária", por exemplo.

O médico João Vaz foi procurado e reafirmou tudo o que disse no vídeo.



O Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro não informa se alguma denúncia contra o médico foi recebida ou mesmo se qualquer penalidade foi aplicada. Na nota, o conselho diz que "existe um rito para se respeitar, inclusive, com o direito à ampla defesa" e que "se houver uma denúncia, ela vai ser enviada ao médico para que ele possa se explicar".



"Neste caso, um sindicante conselheiro vai avaliar se há algum indício, juntar as provas como um processo similar a um rito jurídico. Não é possível ter uma resposta rápida. E, agora, estamos nesse momento de restrição. O setor de processos ainda está se adequando para a reabertura. Então, se houver alguma denúncia, ela será apurada e, após todas as verificações necessárias, será dada a finalização do processo."
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Maior credibilidade



Além disso, também circulam nas redes sociais áudios, vídeos e mensagens que apenas usam os nomes de profissionais de saúde. Os profissionais, porém, são vítimas, já que não produziram o conteúdo e só tomaram conhecimento após a viralização do material. O Conselho Regional de Medicina de Goiás, por exemplo, informou que foi procurado no fim de março por uma médica que "teve o nome indevidamente vinculado a um áudio falso veiculado em grupos de WhatsApp com informações incorretas sobre a pandemia".


O Fato ou Fake já checou também mensagens falsas que envolvem profissionais da saúde. Entre elas estão um video com a alegação de que uma equipe médica forjou um caso da Covid-19 em São Paulo e uma foto que dizia que um profissional estava segurando um caixão com apenas dois dedos e enterrando caixões sem corpos em Manaus.


Em outra desinformação, um vídeo feito por uma enfermeira foi tirado de contexto e passou a ser compartilhado como se fosse novo, mostrando uma UTI vazia em Salvador, na Bahia. No entanto, a gravação era de 21 de março, e não de 21 de abril, quando se tornou viral. A mensagem dizia ainda que a enfermeira foi demitida após ter "denunciado" a farsa do novo coronavírus, o que também não era verdade, como mostrou a checagem do Fato ou Fake.


O cenário da pandemia da Covid-19 também foi aproveitado por falsos médicos, que tentaram lucrar com fórmulas milagrosas para combater a doença.


Durante a pandemia, também precisaram ser checadas ou até foram alvos de investigações dos órgãos públicos outras várias falsas curas milagrosas da Covid-19, como as do feijão milagroso, do chá de artemísia, da aplicação do ozônio e da mistura de limão com bicarbonato, entre outros.

A Organização Mundial de Saúde fez um alerta em fevereiro deste ano do risco da infodemia, com o alto volume de informações que dificulta o acesso a fontes e orientações confiáveis.

Em 14 de maio, profissionais e organizações de saúde de vários países lançaram uma campanha internacional pedindo ações para combater informações falsas divulgadas na internet sobre a pandemia

do novo coronavírus.
Campanha internacional pede ações para combater informações falsas sobre pandemia
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Punição a profissionais



O presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Mauro Ribeiro, e o diretor do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) Gilney Guerra lembram que médicos e enfermeiros precisam seguir o código de ética das categorias. Caso os profissionais não cumpram as regras, eles podem sofrer penalidades.

Segundo Guerra, a medida adotada pelo conselho depende da gravidade da denúncia, da veracidade dos fatos, do dano que causou ao terceiro, dos antecedentes profissionais, entre outros. São possíveis penalidades:


  • Advertência verbal
  • Multa em dinheiro
  • Censura (manifestação do conselho censurando o ato no Diário Oficial e num jornal de circulação)
  • Suspensão temporária do exercício profissional
  • Cassação do exercício profissional

Guerra lembra ainda que a resolução 544 de 2017 do Cofen respeita a liberdade de expressão dos enfermeiros, mas define critérios para uso e comportamento dos profissionais nas redes sociais. Entre os itens proibidos pelo conselho estão a divulgação de fotos de pacientes sem o consentimento deles nas redes sociais; a propaganda de método ou técnica sem comprovação científica e que esteja vedado pela legislação de enfermagem vigente; e a adulteração de dados estatísticos.


"O profissional de saúde tem que se basear nas evidências científicas. Quando ele divulga algo baseado em um estudo que foi publicado por uma revista e que traz uma fonte de informação, ele não pode ser censurado. Mas quando o profissional de saúde traz à tona determinadas recomendações que não têm evidência científica, não são recomendadas por autoridades sanitárias do país, como secretarias estaduais, Ministério da Saúde, ou mesmo OMS, ele está fazendo na verdade um desserviço. Ele está trazendo desinformação", diz o diretor do Cofen e professor de enfermagem do Centro Universitário do Planalto Central (Uniceplac).


O presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Mauro Ribeiro, reforça que os médicos também devem checar se as fontes são confiáveis antes de compartilhar ou produzir conteúdo para divulgar nas redes sociais.



"Como profissionais, recomenda-se aos médicos que usem as redes sociais dentro dos limites estabelecidos pelo Código de Ética Médica, ou seja, com o uso de informações validadas cientificamente e no intuito de promover a adoção de comportamentos e hábitos saudáveis. Não é recomendável aos médicos e a qualquer outra pessoa distribuir informações sem que as fontes sejam confiáveis", diz Mauro Ribeiro, presidente do CFM.


Ribeiro acrescenta ainda que qualquer pessoa que identifique situações em que o médico descumpra o código de ética "pode apresentar sua queixa no Conselho Regional de Medicina do estado onde ocorreu a situação que considerou irregular". "É importante, mas não obrigatório, juntar documentos, imagens e outros documentos. Com base nisso, o CRM que vai apurar o assunto e tomar as medidas cabíveis."


Guerra lembra que a denúncia pode ser feita tanto pelo site quanto presencialmente nos conselhos regionais. "Todos os conselhos regionais têm que averiguar as denúncias. Qualquer cidadão pode preencher o formulário no site e também ir diretamente à sede dos conselhos. A
denúncia anônima é vedada", afirma.
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Veja a situação em cada estado:



Acre: os conselhos regionais de medicina e enfermagem dizem que não receberam denúncia e, portanto, não houve sindicância nem processo ético que envolvam fake news ou curas milagrosas durante a pandemia.




Alagoas: o Conselho Regional de Enfermagem diz que recebeu uma denuncia sobre o tema. Não houve, porém, sindicância nem processo ético. O Conselho Regional de Medicina diz que não houve denúncia nem sindicância nem processo ético.



Amapá: os conselhos regionais de medicina e enfermagem dizem que não receberam denúncia e, portanto, não houve sindicância nem processo ético que envolvam fake news ou curas milagrosas durante a pandemia.


Amazonas: o Conselho Regional de Enfermagem diz que não houve denúncia nem sindicância nem processo ético. Já o Conselho Regional de Medicina não respondeu.



Bahia: o Conselho Regional de Medicina diz que recebeu três denúncias, sendo que houve sindicância em dois casos que identificaram médicos anunciando nas redes sociais promessas de medicamentos ou tratamentos contra a Covid-19. Em um dos casos foi instaurado um processo ético, que está em fase de instrução e no qual foi também foi aplicada ao médico uma interdição cautelar. O outro caso está em fase de diligências. Já o Conselho Regional de Enfermagem diz que não houve denúncia nem sindicância nem processo ético.



Ceará: o Conselho Regional de Enfermagem diz que não houve denúncia nem sindicância nem processo ético. Já o Conselho Regional de Medicina não respondeu.



Distrito Federal: o Conselho Regional de Medicina diz que houve "um caso como o relatado" e que o conselho regional "proibiu o médico de exercer a medicina". "Ele ficou cerca de dois meses sem atuar, recorreu da decisão ao Conselho Federal de Medicina (CFM) e teve a interdição revogada, podendo voltar a exercer a medicina por determinação do Tribunal Superior de Ética Médica do CFM. O colegiado acolheu um recurso do profissional em julgamento no dia 28 de maio de 2020. Apesar da decisão, o processo continua em andamento. O mérito do processo ético profissional ao qual o médico responde ainda será julgado pelo CRM-DF. O médico pode ser absolvido ou receber punição que varia de advertência até a cassação do exercício da medicina. O CRM-DF tem um prazo de cinco anos para julgar processos administrativos", diz. Já o Conselho Regional de Enfermagem diz que não houve denúncia nem sindicância nem processo ético.



Espírito Santo: o Conselho Regional de Medicina diz que recebeu cinco denúncias, sendo que em duas foram feitas sindicâncias. As outras três estão no Setor de Fiscalização porque a denúncia feita não encaminhou material comprobatório ou em análise na Corregedoria do CRM-ES. Nenhum processo ético foi aberto. Já o Conselho Regional de Enfermagem afirma que não recebeu denúncia sobre fake news envolvendo profissionais de enfermagem do Espírito Santo, mas que "tomou conhecimento de um farmacêutico de SP que estava dando informações erradas sobre uso de máscara". "Nesse caso, como não podemos processar profissionais de outras categorias, o Coren-ES

encaminhou ofício ao Conselho Regional de Farmácia de SP solicitando providências", diz.



Goiás: o Conselho Regional de Enfermagem diz que recebeu uma denúncia e que realizou sindicância, mas não há processo ético. Já o Conselho Regional de Medicina diz que recebeu apenas uma denuncia, mas que se tratava "de uma médica que teve o nome indevidamente vinculado a um áudio falso veiculado em grupos de WhatsApp com informações incorretas sobre a pandemia". Segundo o conselho, no fim de março, "a própria médica comunicou o fato ao Cremego e à Polícia Civil" e "imediatamente, o Cremego divulgou em suas redes sociais e demais canais de comunicação um alerta à população sobre a divulgação de fake news relacionadas à pandemia e orientou a todos que busquem informações sobre a Covid-19 apenas em fontes confiáveis, como o próprio Cremego (que sempre divulga notícias atualizadas sobre o assunto) e o Ministério da Saúde".



Maranhão: o Conselho Regional de Enfermagem diz que não houve denúncia nem sindicância nem processo ético. Já o Conselho Regional de Medicina não respondeu.

Mato Grosso: o Conselho Regional de Medicina diz que recebeu duas denúncias que geraram sindicâncias, mas que não há processo ético. "Em um dos casos, trata-se de um profissional médico, cujo nome não será citado, que levanta questões polêmicas, contrapondo as estatísticas sobre avanço do novo coronavírus. Em um vídeo, enfatiza: 'estão fabricando mortos por coronavírus'", afirma o conselho. O Conselho Regional de Enfermagem diz que não houve denúncia nem sindicância nem processo ético.


Mato Grosso do Sul: os conselhos regionais de medicina e enfermagem dizem que não receberam denúncia e, portanto, não houve sindicância nem processo ético que envolvam fake news ou curas milagrosas durante a pandemia.



Minas Gerais: os conselhos regionais de medicina e enfermagem dizem que não receberam denúncia e, portanto, não houve sindicância nem processo ético que envolvam fake news ou curas milagrosas durante a pandemia.


Pará: o Conselho Regional de Medicina diz que não houve denúncia nem sindicância nem processo ético. Já o Conselho Regional de Enfermagem não respondeu.


Paraíba: os conselhos regionais de medicina e enfermagem dizem que não receberam denúncia e, portanto, não houve sindicância nem processo ético que envolvam fake news ou curas milagrosas durante a pandemia.


Paraná: o Conselho Regional de Enfermagem diz que recebeu duas denúncias por meio da ouvidoria, mas que não houve sindicância nem processo ético. "Um deles se referia a uma técnica de enfermagem que gravou um vídeo alcoolizada, dizendo que o coronavírus não traz mal algum. O outro se refere a um enfermeiro que participou de uma festa sem respeitar as normas de distanciamento e de prevenção. Os dois relatos eram baseados em postagens de redes sociais e não se referem ao período de exercício da profissão, ficando prejudicada a admissibilidade da denúncia." Já o Conselho Regional de Medicina afirma que não houve sindicância nem processo ético, mas não informa quanto a denúncias.

Pernambuco: o Conselho Regional de Medicina diz que não houve denúncia nem sindicância nem processo ético. Já o Conselho Regional de Enfermagem não respondeu.

Piauí: os conselhos regionais de medicina e enfermagem dizem que não receberam denúncia e, portanto, não houve sindicância nem processo ético que envolvam fake news ou curas milagrosas durante a pandemia.


Rio de Janeiro: o Conselho Regional de Medicina não respondeu. "Processos éticos são proibidos de divulgação, por lei, assim como fatos jurídicos. Ao fim destes, eles são publicados em diários oficiais", diz o conselho. Já o Conselho Regional de Enfermagem diz que recebeu seis denúncias, sendo que cinco geraram sindicâncias e um virou processo ético. O conselho cita ainda que as denúncias se referem, por exemplo, a "enfermeiro ensinando protocolos de tratamento para a Covid-19 em redes sociais", "enfermeira dizendo que a autohemoterapia previne a Covid-19" e "auxiliar de enfermagem debochando do uso de máscaras de pano e se vangloriando do equipamento que usa como profissional".


Rio Grande do Norte: os conselhos regionais de medicina e enfermagem dizem que não receberam denúncia e, portanto, não houve sindicância nem processo ético que envolvam fake news ou curas milagrosas durante a pandemia.



Rio Grande do Sul: o Conselho Regional de Medicina diz que recebeu oito denúncias e que foram feitas sindicâncias, mas não foi aberto processo ético. Já o Conselho Regional de Enfermagem diz que não houve denúncia nem sindicância nem processo ético.

Rondônia: os conselhos regionais de medicina e enfermagem dizem que não receberam denúncia e, portanto, não houve sindicância nem processo ético que envolvam fake news ou curas milagrosas durante a pandemia.

Roraima: o Conselho Regional de Enfermagem diz que não houve denúncia nem sindicância nem processo ético. Já o Conselho Regional de Medicina não respondeu.

Santa Catarina: o Conselho Regional de Medicina diz que foi aberto um processo ético, mas não informa quanto a denúncia ou sindicância. Já o Conselho Regional de Enfermagem diz que não houve denúncia nem sindicância nem processo ético.



São Paulo: o Conselho Regional de Medicina diz que recebeu 38 denúncias, sendo que foram realizadas sindicâncias em 18 casos e que um caso virou processo ético. Já o Conselho Regional de Enfermagem afirma que foram 10 denúncias e que "os processos éticos correm em sigilo até sua conclusão. Como não houve sequer a abertura de sindicância, exporíamos profissionais sem alternativa de manifestação e contrariando as normativas."


Sergipe: os conselhos regionais de medicina e enfermagem dizem que não receberam denúncia e, portanto, não houve sindicância nem processo ético que envolvam fake news ou curas milagrosas durante a pandemia.


Tocantins: o Conselho Regional de Medicina diz que recebeu uma denuncia e que também houve sindicância e processo ético. "Encontra-se em curso neste regional o processo ético-profissional cumulado com interdição cautelar (em cumprimento pelo médico) em desfavor do médico Joaquim Rocha Pereira". O médico foi citado anteriormente pela reportagem. "Tal processo foi instaurado em virtude de vídeos veiculados em redes sociais, onde, dentre outras colocações, o médico recomenda o uso de chás como forma de prevenção ao novo coronavírus", afirma o conselho. Já o Conselho Regional de Enfermagem diz que não houve denúncia nem sindicância nem processo ético.