sábado, 26 de agosto de 2017

Médicos condenados por retirada ilegal de órgãos são soltos em MG

Profissionais serão monitorados com tornozeleiras eletrônicas em Poços. 
Após 102 dias presos, eles vão aguardar habeas corpus em liberdade


Do G1 Sul de Minas

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Os três médicos acusados por retirada e transplante ilegal de órgãos foram soltos na noite desta sexta-feira (3) e agora aguardam o julgamento do habeas corpus em liberdade. Os profissionais Jefferson Skulski, João Alberto Góes Brandão e Cláudio Rogério Carneiro Fernandes foram transferidos de Três Corações (MG) para Poços de Caldas (MG), onde participaram de uma pequena audiência no Fórum, com o juiz Narciso Alvarenga Monteiro de Castro.
Durante a audiência, os médicos foram informados das medidas cautelares que devem ser respeitadas durante o período em que aguardam julgamento. Eles estão proibidos de se ausentar de Poços de Caldas por mais de três dias, devem ficar presos em domicílio e estão obrigados a comparecer ao fórum mensalmente. Além disso, os três médicos serão monitorados eletronicamente com tornozeleiras. A decisão do juiz, porém, não implica no trabalho dos profissionais como médicos.
Os médicos ficaram presos há 102 dias. Segundo Fábio Camargo, advogado de um dos médicos, eles ficaram dois meses em Poços de Caldas (MG) e em seguida foram transferidos para Três Corações (MG).
Os três profissionais foram condenados em primeira instância no chamado “Caso 5”, pela morte de Paulo Lourenço Alves, que de acordo com a Justiça, ainda estaria vivo no momento de retirada de rins e córneas. O caso aconteceu em 2001 em Poços de Caldas (MG).
De acordo com a sentença, o urologia Cláudio Rogério Carneiro Fernandes foi condenado a 17 anos de prisão, o radiologista Jefferson Skulski pegou uma pena de 18 anos e o nefrologias João Alberto Góes Brandão foi condenado a 19 anos.
Médicos João Alberto Brandão, Cláudio Rogério e Jeferson Skulski foram detidos em Poços de Caldas (Foto: Reprodução EPTV)Médicos João Alberto Brandão, Cláudio Rogério e Jeferson Skulski foram detidos em Poços de Caldas (Foto: Reprodução EPTV)
Outros três médicos foram julgados neste processo. Paulo César Pereira Negrão foi condenado a 16 anos de prisão, mas cumpre pena em liberdade. O juiz responsável pelo caso, Narciso Alvarenga Monteiro de Castro, concluiu que a participação dele foi insuficiente para a prisão. Entretanto, eles receberam medidas cautelares.
O médico e ex-secretário de Saúde, José Júlio Balducci, foi absolvido e a oftalmologista Alessandra Queiroz Araújo não foi presa porque o juiz entendeu que a pena era pequena e foi prescrita. Os advogados dos médicos informaram que ainda não há novidades no caso em relação ao habeas corpus.
Dois dos médicos acusados por este crime – João Alberto Góes Brandão e Cláudio Rogério Carneiro Fernandes  - já foram condenados em outros casos da chamada ‘Máfia dos Órgãos’. Este último chegou a ficar preso por 30 dias pela condenação de 17 anos, por envolvimento no caso do menino Paulo Veronesi Pavesi, o Paulinho, em 2001. O caso ficou conhecido como 'Caso Pavesi' e foi o que deu início às investigações a outros oito casos referentes ao tráfico de órgãos na cidade.
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Médicos foram ouvidos no 3º dia das audiências de instrução e julgamento em Poços de Caldas (Foto: Reprodução EPTV)Caso foi julgado em julho de 2014 em Poços de Caldas (Foto: Reprodução EPTV)
Entenda o caso
O caso denominado como ‘Caso 5’  aconteceu há 15 anos e vitimou Paulo Lourenço Alves, na época com 41 anos. Segundo o processo, a vítima morreu em 15 de janeiro de 2011 no Hospital da Santa Casa. Após a morte encefálica,  as córneas teriam sido retiradas e enviadas para Varginha (MG) e os rins, embora retirados, não foram transplantados.
De acordo com a denúncia,  no prontuário da vítima não consta o laudo do exame que comprovaria a morte cerebral do paciente, que teria sido doador cadáver. Não foram encontrados também registros médicos relatando as condições clínicas do paciente e nem foi possível confirmar se as córneas foram encaminhadas para Varginha.
Para a promotoria, o paciente que teve os órgãos retirados em 2001 ainda estava vivo antes da cirurgia e os seis médicos que participaram do procedimento foram denunciados pela falha no diagnóstico de morte encefálica e remoção ilegal de órgãos.
Para o Ministério Público, há a denúncia de que o paciente havia ingerido bebida alcoólica no dia anterior à internação. Dessa forma, nenhum procedimento a fim de diagnosticar a morte encefálica deveria ter sido realizado, já que o álcool funciona como depressor do Sistema Nervoso Central (SNC). Por isso, os médicos são acusados de ter condutas que teriam como finalidade a morte da vítima para a captação dos órgãos.
Denúncias do Ministério Público referentes aos médicos
O nefrologista e intensivista João Alberto Góes Brandão é apontado como o participante de todas as fases da captação, o que é expressamente proibido pela Lei de Transplantes. Segundo o Ministério Público, ele teria assistido ao paciente, mas não teria executado os procedimentos necessários para salvar a vida do mesmo e teria feito o exame para diagnosticar a morte encefálica de forma fraudulenta.
O denunciado também procedeu a notificação ao MG Sul Transplantes - entidade considera clandestina - e também avisou a família sobre a morte cerebral do paciente, obtendo autorização para a doação. Já o urologista e cirurgião Cláudio Rogério Carneiro Fernandes atuou diretamente na extração dos rins do doador.
Ainda na denúncia da promotoria, o gastroenterologista Paulo César Negrão atestou o diagnóstico de morte encefálica sem observar parâmetros legais. E o radiologista Jeferson Skulski usou técnica diferente da recomendada na literatura médica para a detecção da morte, o que impossibilitou o diagnóstico correto.
O médico José Júlio Balducci participou como anestesista da cirurgia de retirada de órgãos da vítima. Já a oftalmologista Alessandra Angélica Queiroz Araújo foi responsável pela extração das córneas, mesmo não possuindo autorização legal para realizar transplantes.
Para a promotoria, todos os envolvidos sabiam que a vítima poderia ainda estar viva e ainda assim prosseguiram com a cirurgia, assumindo o risco de morte do paciente.
Paulinho Pavesi morreu aos 10 anos após cair, passar por cirurgia e ter os órgãos removidos (Foto: Paulo Pavesi/ Arquivo Pessoal)Paulinho Pavesi morreu aos 10 anos após cair, e ter
os órgãos removidos (Foto: Arquivo Pessoal)
Outros casos relacionados e a suposta "Máfia dos Órgãos"
Os médicos aparecem ainda em outros processos ligados à 'Máfia dos Órgãos'.  O 'Caso 2', que foi julgado recentemente está ligado ao 'Caso 3', que ainda tramita na Justiça e terminou com a morte da vítima Alice Mezavila Tavares, na época com 49 anos, após receber um rim doado por um paciente supostamente assassinado. Ela esperou pelo menos três anos pelo transplante do órgão e segundo a família, as causas apontadas pela Santa Casa foram infecção generalizada e insuficiência renal crônica. Em outra caso, uma vítima de 50 anos não teve os órgãos captados, no entanto, o motivo não consta no prontuário médico. A morte aconteceu no dia 6 de junho de 2001.
As investigações de diversos casos referentes à retirada ilegal de órgãos na Santa Casa de Poços de Caldas tiveram início após a morte do menino Paulo Veronesi Pavesi, o Paulinho, em 2000. A criança, na época com 10 anos, teria tido os órgãos removidos enquanto ainda estava viva. Em 2013, três dos médicos envolvidos foram condenados em primeira instância a penas que variam entre 14 e 18 anos  e dois deles passaram um mês detidos no Presídio de Poços de Caldas. Eles conseguiram o direito de recorrer em liberade, mesmo após as condenações.
Há ainda a expectativa de que outros quatro médicos sejam levados à júri popular por conta da morte do Caso Pavesi. No entanto, no começo deste mês, o julgamento deste caso, que acontecia em Belo Horizonte, foi suspenso. O Caso 1 também já foi julgado e condenou os médicos Alexandre Crispino Zincone, João Alberto Góes Brandão, Celso Roberto Frasson Scafi e Cláudio Rogério Carneiro Fernandes em primeira instância.

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